domingo, 7 de outubro de 2012

Severino suplicando a Deus



Pai Nosso
Que tá aqui e acolá,
Na terra, no céu,
Em qualquer lugar.
Pai do rico e do pobre,
Do home e da muié,
Do preto, do branco.
Pai até daquele que não tem fé.
Santo é Seu Nome,
Bendita é a Sua Terra
Onde um dia eu nasci
Num ranchinho, lá no Pé da Serra.

Vem a nóis
Vem de perto ver o sertão,
Pisar no seu chão rachado
Pela seca que alastra,
Que maltrata o home
E mata a criação.

Seja feita a Sua vontade,
Mas lhe peço, de coração,
Tem pena dessa gente, 
Tem de nóis compaixão.
O sol abrasador,
As nuvens cinzentas e tristes,
É sinal que a chuva vai demorar.

O pasto não mais existe,
A criação morre de fome,
Na cacimba não mina mais água,
A tristeza me consome.
Sentadinha, num cepo, na cozinha,
A Filó chora, que dá até dó,
Com um fi na barriga
E os outros no seu redor.

Chiquim tá com febre,
Joaninha com dor de dente,
Rosinha com cachumba,
Zeca com catapora,
Cobra mordeu o Juquinha
E Mané, o mais véi,
Eu mandei embora,
procurar trabaio
Na capitá de San Palo,
Buscá a sorte lá fora.
O pão de cada dia
Ja farta aqui no sertão
Até os animais ta passano privação.
A fome ja matou Pulu,
O meu jeguinho de estimação.

Ainda ontem morreu Traíra,
Minha cadelinha,
Lembrança do meu irmão.
Pai! Perdoa a coitadinha da Filó,
que aflita me pediu:

"- Meu marido, vamo embora daqui,
Vamo morar na cidade.
Nossos fi tá sofreno,
Passano necessidade".
Pai Nosso,
Não me dexa cair na tentação,
Livrai-me da cidade,
Quero viver no meu sertão,
Cuidar do meu roçado
Junto da minha famia
Com a Sua proteção.
Amém.
(Oração de Severino, In As Dores da Seca, pp. 104,105,106)
By Terezinha teixeira Santos
Imagens: Google